Quase um século depois
do domínio do bando
de Lampião nos sertões
nordestinos, a polícia
da Paraíba se vê
obrigada a criar
tropa especial para
combater o crime
no interior do Estado.
Assim surgiu a Companhia
de Operações
em Área de Caatinga,
a volante moderna
que tem a missão
de combater o novo
cangaço, representado
principalmente
pelas quadrilhas de
assalto a bancos e
Correios.
-
PMs com preparação específica... Técnica apurada. Policiais são habilitados para atuar em vários cenários; eles treinam corpo, mente e formas de surpreender criminosos...
Segundo o comandante da
Companhia e coordenador do
curso, capitão Wherick Felicio
de Lima, que já comandou
três operações da Força
Nacional no Brasil, a criação
da tropa especial foi feita também
para dar apoio às polícias
que atuam em pequenas cidades
do interior, alvo primário
dos bandidos que cercam os
destacamentos dos municípios
onde escolhem atacar. “O
comandante Euller Chaves
autorizou um novo curso já no
intuito de montar uma tropa
voltada a essas ações. Não propriamente
ações de bancos,
mas também de suplementação
nas cidades pequenas.
São policiais que conheçam
esses territórios, que saibam
operar em viaturas, com emprego
de GPS, com cavalo e, se
necessário, com todo meio de
transporte disponível na Polícia
Militar: moto, helicóptero,
embarcação, na parte de operação
ribeirinha na busca de
roça de maconha nos grandes
açudes. Os policiais são habilitados
para atuar em vários
cenários”, destacou.
Cadetes em treinamento.
Enquanto
as antigas volantes do
cangaço passavam até três
meses “embrenhadas” no mato
em busca de cangaceiros, as
volantes modernas treinam o
corpo, a mente e a técnica para
surpreender criminosos. No
último curso, dos 30 policiais
formados, dois eram da Polícia
Nacional Paraguaia, um da
PM da Bahia, e outro da PM do
Rio Grande do Norte.
Uma turma do Curso de Formação
de Ofi ciais (CFO) que
se forma em dezembro, esteve
durante a semana, passando
por um treinamento base de
seis dias em uma mata fechada
de cerca de 40 hectares.
Eles serão os primeiros oficiais
a saírem da Academia de
Polícia com esta experiência.
No local, eles aprenderam técnicas
de sobrevivência como
manusear fogo, vegetais nativos
da Caatinga para matar
a fome e a sede, construir um
pequeno abrigo, administrar
o sono e atirar com precisão
em terrenos declives e acidentados,
em períodos de altas
temperaturas e ambientes
noturnos. São 14 horas por dia
expostos ao meio ambiente.
A cadete Ana Vieira, uma
das três mulheres da turma,
carrega uma mochila de
10 quilos nas costas. Cada
compartimento conta com
utensílios essenciais para a
sobrevivência fora da base.
Colchonete para dormir, cantil
de água, canivete, blocos
de anotação, uma espingarda
12 e munições para treinos.
Ela será a primeira militar da
família. Um sonho de criança
que ela vê crescer desde que
ingressou no Centro de Educação
da PM, em 2015.
Água na Caatinga.
Sob o sol
castigante da Caatinga, os
cadetes sobem um lajedo no
qual encontram uma pequena
porção de água. A cor esverdeada
mostra que a água
encontrada não está própria
para consumo. O instrutor é
o sargento Olivino. Ele ensina
técnicas de purifi cação da
água através da fervura, se
disponível, ou cloro.
Os cadetes aprendem a detectar
a vegetação local e se
utilizar dela. Em operações
longas, os policiais podem
utilizar cactáceas como a ‘coroa
de frade’ ou a raiz do umbuzeiro para matar a sede.
Outra forma de obter água é
através de evapotranspiração,
uma técnica utilizada
em árvores com folhas lisas.
Demonstrações foram feitas
com as folhas de aroeira e umbuzeiro.
Para fazer parte deste grupo
especial de policiais não
é necessários somente ter o
conhecimento. Cada policial
formado precisa ter didática
para repassar as técnicas a
outros policiais e assim formar
novas equipes. “Temos
provas teóricas e provas práticas.
Se o policial chega aqui
e não consegue me descrever
o fuzil que ele utiliza, para
nós ele não serve, porque ele
também não vai servir como
instrutor. É preciso ter confi
ança no policial que a gente
treina, porque da mesma
forma que a gente está ali, em
meio aos alvos, confi ando na
precisão do nosso policial, é
o cidadão que estará na rua.
Então não é só a carga física”,
descreve capitão Wherick.
Pocinhos: ponto estratégico...
A cidade de Pocinhos foi
o ponto estratégico escolhido
pela Polícia Militar para
implantar a Companhia
Especializada, mas não só
pela localização geográfica.
“O Antônio Silvino foi o
cangaceiro que antecedeu
Lampião e passou várias
vezes por Pocinhos. Um homem
que aterrorizou muito
e morreu em 1944 em Campina
Grande. Os comandantes
Euller Chaves (Comando Geral) e Pablo Nascimento
da Cunha (10º Batalhão) nos
deram a missão de escolher
um ponto viável e estratégico
e escolhemos Pocinhos. É
um município estratégico e
bem localizado entre o Brejo
e o Sertão, e além disso
tem uma conotação histórica
muito importante. Foi
justamente nessa área, que
teve a passagem de Antônio
Silvino. E na época da colonização,
haviam os índios
Tarairiús que eram muito
aguerridos e contra a dominação
portuguesa. Então a
gente juntou tudo isso para
não ter somente um contexto
policial, mas também
histórico da unidade”, justifi
cou.
Rural x urbano. O capitão
César de Figueiredo Urach,
instrutor de tiro de ação e
ref lexo, que já passou pelo
Centro de Instrução de
Guerra na Selva do Exército,
conta que o policial em
treinamento precisa ser
atento às características do
ambiente em que atua. “Para
o treinamento em ambiente
rural vale muito os sentidos.
A observação e a audição são
muito utilizadas. O barulho
na mata chama a atenção e
um desses alvos utilizados
pelos cadetes faz um barulho
para voltar a atenção do
combatente. É preciso ser
perspicaz e perceber o ambiente”,
orienta. Jornal Correio