Prefeitos chorões ‘enfiam pé na jaca’
Quando assumiram seus cargos, prefeitos
eleitos fizeram intenso jogo midiático para mostrar os desmandos
deixados por antecessores – geralmente seus adversários políticos. Seis
meses depois, dados do Sagres (que acompanha os gastos do poder público)
revelam que os prefeitos não só não resolveram os problemas, como, em
alguns casos, pioraram a situação, gastando além da conta.
Seis meses depois, o que mudou...
Muitos dos prefeitos que assumiram seus
cargos no dia 1º de janeiro usaram parte do tempo inicial dos seus
mandatos para exibir na mídia os desmandos encontrados em suas cidades.
Descreveram situações caóticas onde faltava desde material de expediente
até dinheiro nos cofres municipais, havia servidores com salários
atrasados há meses e indícios de desvios de verbas nos últimos dias das
gestões que se encerravam.
Seis meses depois, muitos dos novos
prefeitos não só não resolveram os problemas que denunciaram como
pioraram o quadro em alguns casos. Há prefeituras em que, hoje, há mais
servidores contratados sem concurso público do que no ano passado.
Conforme levantamento feito junto ao
Sistema de Acompanhamento da Gestão dos Recursos da Sociedade (Sagres)
do Tribunal de Contas do Estado da Paraíba (TCE), alguns deles elevaram a
folha de pessoal em mais de R$ 1 milhão só com a contratação de
prestadores de serviços.
Como foi o caso do prefeito afastado de
Bayeux, Breg Lima (Podemos), preso em flagrante na quarta-feira passada
em uma ação controlada realizada pela Polícia Civil com a ajuda do Grupo
de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) do
Ministério Público da Paraíba (MPPB) após receber dinheiro de um
empresário fornecedor da prefeitura.
O prefeito afastado iniciou a gestão em
janeiro, com 907 servidores contatados, no valor de R$ 1,3 milhão. Em
maio, já contava com 2.074 contratados por excepcional interesse
público, para quem foi pago R$ 2,7 milhões, e que representou um aumento
de 128,6% do número de servidores nessa modalidade em apenas cinco
meses.
Outro exemplo, é o de Santa Rita, onde o
número de contratados foi elevado em 801,33% este ano. Quando assumiu a
gestão, o prefeito Emerson Panta (PSDB) contava com apenas 75 servidores
contratados, que recebiam R$ 101,7 mil. Em maio, ele fechou a folha de
pessoal com 676 servidores contratados, receberam R$ 1,3 milhão da
Prefeitura. Em dezembro do ano passado, havia 292 prestadores de
serviços no município.
No Conde, a prefeita Márcia Lucena (PSB),
iniciou a gestão com 176 contratados, que recebiam R$ 342,3 mil. Em
maio, o número mais que dobrou, passou para 588 servidores, que
receberam R$ 861 mil, representando no aumento de 234,09% no número de
prestadores de serviços. Em dezembro havia 281 contratados.
Em Alhandra, o prefeito Renato Mendes
(Democratas), elevou em 203,13% o número de servidores contratados sem
concurso. Em janeiro, quando ele reassumiu o comando da prefeitura havia
96 contratados, no valor de R$ 259,8 mil. Em maio Mendes fechou o mês
com 291 contratados, com os quais foram pagos R$ 641,4.
Em Mamanguape, a prefeita Maria Eunice
(PSB), que também decretou situação de emergência no município no início
da gestão, contou com apenas dois servidores contratados no mês de
janeiro, com os quais foram gastos R$ 2,8 mil.
Em maio, ela passou a contar com 38
contratados, no valor de R$ 38,9 mil. Já o prefeito da sertaneja
Princesa Isabel, Ricardo Pereira (PSB), contratou em janeiro apenas
quatro servidores, para os quais foram pagos R$ 52,7 mil. Fechou maio
com 10, com os quais foram gastos R$ 79,8 mil.
TORRES: ‘CHORAM DE BARRIGA CHEIA’
O presidente do Tribunal de Contas do
Estado da Paraíba (TCE-PB), André Carlo Torres Pontes, afirmou que os
prefeitos paraibanos “choram de barriga cheia”, porque no primeiro
quadrimestre a arrecadação dos 223 municípios paraibanos foi de R$ 2,8
bilhões, o equivalente a 13% a mais do que foi arrecado no mesmo período
do ano passado. Com base nos dados apresentadores pelos gestores e
disponibilizados nos painéis de acompanhamento da gestão do TCE, o
presidente informou ainda que, as despesas dos municípios nos primeiros
quatros meses foram de R$ 2,4 bilhões. “Eles gastaram menos do que
arrecadaram. E não se queixaram mais junto ao TCE por conta da situação
financeira de seus municípios”, comentou. André Carlo Torres disse ainda
que a nova metodologia de trabalho adotada pelo TCE de acompanhamento
da gestão tem sido benéfica os gastos públicos, porque tem condição de
fazer um diagnóstico prévio sobre as contas do município por meio da
emissão de alertas. Este ano o órgão já emitiu mais de 1.500 alertas
para que os gestores municipais adotem medidas corretivas em balancetes
mensais, em leis orçamentárias anuais (LOAs) e demais atos da gestão,
inclusive pelo excesso de contratação de pessoal, inclusive com a
abertura de procedimentos para analisar a legalidade dos contratos. Os
alertas foram destinados prefeituras, câmaras municipais, ao Governo do
Estado e demais órgãos públicos estaduais, apontando irregularidades
identificadas e encaminhadas para que os gestores tomem conhecimento e
adotem as medidas cabíveis para saná-las. As irregularidades mais comuns
são: equívoco na legislação orçamentária, deficiência no Portal da
Transparência, balancetes apresentados com a necessidade de correções.
GESTORES APONTAM AVANÇOS
De acordo com os gestores, a contratação
dos servidores não afeta as finanças de seus municípios e estão dentro
da margem de gasto estabelecido pela Lei de Responsabilidade Fiscal
(LRF) para gastos com pessoal. Além disso, eles afirmam que apesar da
situação de emergência administrativa, financeira e das dívidas deixadas
pelos seus antecessores, conseguiram dar a voltar por cima e organizar a
casa nesses primeiros seis meses. Os prefeitos afirmam que as contas da
atual gestão estão sendo pagas em dia, houve a retomada da execução de
obras e prestações de serviços à população. Os débitos deixados pelos
ex-gestores estão em processo de renegociação, para não inviabilizar as
ações essenciais e ao processo de reestruturação de seus municípios. O
prefeito de Alhandra, Renato Mendes, que decretou estado de emergência
financeira nos primeiros 90 dias, disse que tem conseguido honrar com os
compromissos da atual gestão. Ele revelou que dentro de um planejamento
rigoroso e com o pé no chão, conseguiu colocar em dia o pagamento dos
servidores e dos credores. Além de reestruturar a administração
municipal com a renovação de frotas de veículos, reaberturas de postos
de saúdes que estavam fechados. A prefeita do Conde, Márcia Lucena, que
também decretou estado de emergência pela ausência de operacionalidade e
de informações para garantir o início da nova gestão, também avaliou de
forma positiva os seis primeiros meses da gestão. Com uma série de
ações para o reordenamento administrativo e financeiro do município, que
está conseguindo manter o pagamento dos servidores dentro do mês
trabalhado e implantar vários programas municipais, entre eles o
Orçamento Democrático. O prefeito de Princesa Isabel, Ricardo Pereira,
disse que a dívida herdada da administração foi de mais de R$ 32
milhões, que vem sendo negociada e parcelada de modo que não prejudique
as ações da atual gestão. Além de um débito de R$ 48 milhões do
Instituto de Previdência do Município, que como revelou o atual gestor
desde o ano de 2000 não vinha sedo repassada. O prefeito de Santa Rita,
Emerson Panta, também aponta avanços em sua cidade, apesar de não ter
conseguido quitar os salários dos servidores deixados em abertos pela
gestão passada. Segundo ele, além recuperação administrativa municipal, a
folha do funcionalismo da atual vem sendo paga em dia e dentro do mês
trabalhado.
SUCESSÃO DE ERROS OU FALTA DE SORTE
Problemas que se repetem. Três municípios
da RM de João Pessoa, segundo especialistas, acumulam insucessos. A
prisão do prefeito de Bayeux, Berg Lima (Podemos) – preso em flagrante
na quarta-feira, por suspeita de crime de corrupção ativa – trouxe de
volta questionamentos sobre as gestões municipais das principais cidades
da Região Metropolitana de João Pessoa (destaque para Bayeux, Santa
Rita e Cabedelo). O afastamento do prefeito do cargo expôs a preocupação
que atinge os moradores das três cidades com a qualidade de seus
gestores e a condução das administração ao longo da história. Um
questionamento que especialistas políticos tentam esclarecer sobre a
dificuldade que esses três grandes municípios têm tido, ao longo dos
anos, na escolha dos seus gestores. Segundo os profissionais ouvidos, a
população pode ser a principal culpada por tantos problemas. O cientista
político, Ítalo Fittipaldi, explicou que apesar de cada cidade ter a
sua particularidade, no caso da Região Metropolitana da Capital o
problema da escolha de mal gestores para comandar as prefeituras
municipais está no eleitorado. “Não há como tirar a culpa dos eleitores
em relação a essa problemática”, disse o especialista. Ele citou como
exemplo a cidade de Cabedelo, um dos maiores PIBs da Paraíba. “Muita
gente mora no bairro de Intermares, mas a maioria não vota na cidade.
Quem vota lá são as pessoas que moram na área mais central. Então basta
pegar dados acerca de escolaridade e nível de renda dos eleitores, que
sem dúvida vamos ver a influência da população para o tipo de
candidatura que está sendo conduzida ao Executivo Municipal”, revelou.
POPULAÇÃO É RESPONSÁVEL
Já o especialista em política, Fábio
Machado, acredita que a dificuldade surge do fato das prefeituras, na
maioria das vezes, terem a tendência a ficar sob o domínio dos mesmos,
geralmente uma ou duas famílias ou grupos, que se revezam no poder
contribuindo para que não ocorra o desenvolvimento e uma administração
que traga mudanças. “Se você analisar de Cabedelo a Cajazeiras, você vai
encontrar problemas dessa natureza. Esse grupo que se intercala no
poder traz prejuízo para a gestão”, explicou. Ele também concorda que
uma parcela da culpa está nos eleitores que elegem seus candidatos para
comandar os municípios. “Nós precisamos traçar também um perfil do grau
de organização da sociedade nessas cidades da Região Metropolitana e ter
ações para que de fato exista cobrança nesses lugares. A gente culpa os
partidos, lideranças e espaços políticos, mas a organização da
sociedade conta bastante. Sem essa organização e ação não há como
modificar a política”, acrescentou o cientista político. O caso mais
recente de problemas no Executivo Municipal foi em Bayeux, onde Berg
Lima foi flagrado ao deixar um restaurante, no bairro do Sesi, após
receber dinheiro de um empresário que é fornecedor da Prefeitura e
também dono do restaurante. Caso complicado também passou Santa Rita,
quando o ex-prefeito Reginaldo Pereira foi afastado do cargo várias
vezes, ora pelos vereadores da cidade ora pela Justiça. Ele teve o
mandato cassado pela Câmara Municipal em 2014, retomou o mandato por
decisão judicial, teve a cassação anulada pela Câmara Municipal.
Causando desgaste a população, o último afastamento de Reginaldo Pereira
da prefeitura aconteceu em setembro de 2015, quando uma decisão
judicial determinou que ele deixasse a prefeitura. A posse do
vice-prefeito Netinho, aconteceu no dia seguinte. Já em Cabedelo foi a
desistência do ex-prefeito Luceninha no ano de 2013, que causou
transtornos à administração. Na época ele alegou dificuldades para gerir
o município, que tem o segundo maior orçamento do estado da Paraíba.
Quem assumiu foi o vice-prefeito Leto Viana, que conseguiu vencer as
últimas eleições e permanece no comando da prefeitura de Cabedelo.
Jornal Correio da Paraíba / domingo, 9 de julho 2017.