Nos anos 60, a Paraíba vivia uma efervescência ferroviária. Um entroncamento (foto), na cidade de ITABAIANA,
permitia que passageiros e cargas, vindos de Pernambuco, seguissem para
o Ceará ou Rio Grande do Norte. O trem que partia para o primeiro
Estado cruzava estações nas cidades de Ingá, Galante, Campina Grande,
Pocinhos, Soledade, Juazeirinho, Assunção, Areia de Baraúna, Patos,
Malta, Pombal, São Domingos, Sousa e São João do Rio do Peixe; o que
decidisse ir para o Rio Grande do Norte, seguia a partir da estação
Paula Cavalcanti, em Cruz do Espírito Santo.
A Paraíba possui ainda estações nas
cidades de Cabedelo, João Pessoa, Santa Rita, Duas Estradas, Sapé, Mari e
Guarabira. Membro da diretoria do Sindicato dos Trabalhadores em
Empresas Ferroviárias no Estado da Paraíba (Sintefep), Anselmo Tavares
lembra como o Estado já foi rico em malha ferroviária, cenário que
destoa do que é visto atualmente.
“Hoje só funciona a ferrovia da Região
Metropolitana de João Pessoa. Nem Campina Grande, que é a segunda maior
cidade do Estado, conservou o espaço. Apesar dela estar numa área
central, tem um grande território que é desabitado, sem iluminação. Fica
um buraco negro imenso entre o bairro do Centenário e o bairro da
Liberdade. Você tem uma cidade grande, com um patrimônio daquele, e não
se faz nada”, lamentou.
O representante dos ferroviários no
Estado explica que este cenário é o mesmo em diversos outros
equipamentos. “A única estação que estava operando até 2012 foi
Itabaiana. Nossa ferrovia, que chegou muito antes da CBTU, foi
inaugurada em 1957, e tinha dois modais: passageiro e carga. Nós
tínhamos o trem que vinha de Pernambuco até o Ceará, o chamado Asa
Branca. Era um trem de longo percurso, saía de Recife. Era uma máquina
grande, com vagão para restaurante, modelo que vemos até hoje em cidades
europeias, mas que na Paraíba e boa parte do Brasil foi colocado de
lado, até que desapareceu”, disse.
Em 2017, a Sintefep estudou a viabilidade
da ampliação do transporte ferroviário de pessoas. A CBTU passaria a
operar de Santa Rita até Guarabira. Por falta de apoio político, o
projeto não andou e hoje o transporte público ferroviário só alimenta a
Grande João Pessoa. Hoje são 30 km de ferrovia, que vão de Cabedelo até
Santa Rita.
Ao passo que o país seguia investindo em
rodovias, seguindo um modelo de desenvolvimento norte-americano, as
ferrovias foram deixadas de lado no Brasil. Na Paraíba, o abandono foi
intensificado entre os anos 70 e 80, até chegar ao cenário atual, onde
só a Região Metropolitana tem vivos seus trilhos.
“A FTL (Ferrovia Transnordestina
Logística) encerrou o CNPJ na Paraíba. Ela não tem mais operação alguma
aqui, não tem mais funcionários e não devolveu o trecho, por questões
contratuais. Ela é ligada a CSN (Companhia Siderúrgica Nacional), que
comanda as ferrovias em sete Estados, dos quais deixou de operar em
Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte”, explicou o representante do
Sintefep.
Em 2015, o Sintefep entrou com uma ação
no Ministério Público Federal (MPF) contra a Agência Nacional de
Transportes Terrestres (ANTT), a União, a Transnordestina Logística SA
(TLSA e a FTL (Ferrovia Transnordestina Logística). No documento,
denunciam o abandono da malha ferroviária paraibana.
“Em 1998, a Companhia Ferroviária do
Nordeste (CFN), empresa do grupo CSN (Companhia Siderúrgica Nacional),
assumiu a malha ferroviária da região. Em 2008, a CFN passou a se chamar
Transnordestina Logística SA (TLSA). Em 2014, houve uma cisão: a TLSA
ficou com novas obras ferroviárias e nasceu a ‘moribunda’ FTL, que ficou
com a malha antiga, entre elas a Paraíba. Em outubro de 2017, FTL
encerrou o CNPJ no Estado, dando fim a todas atividades operacionais”,
Anselmo Tavares – Sintefep
Hoje, as estações ferroviárias têm
tombamento temático pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional (Iphan). Para fazer uso desses equipamentos, o órgão precisa
ser provocado e, junto com os interessados, monta um projeto de
requalificação da área. É o que deve acontecer na maior cidade do Sertão
paraibano, Patos.
Em entrevista ao CORREIO, a presidência
da Fundação Cultural de Patos (Fundap), órgão ligado à Prefeitura
Municipal, disse que um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) foi
firmado com os responsáveis pelo Patos Shopping, em construção na
cidade, após aprovação do Iphan. O empreendimento ficou responsável pela
reforma e requalificação do entorno e do edifício da estação
ferroviária da cidade. O espaço, depois de pronto, será administrado
pela gestão do município, que criará um centro cultural.
O transporte de cargas que cortava a
Região Metropolitana de João Pessoa utilizava a mesma linha hoje usada
pela CBTU, entretanto as viagens eram realizadas a noite, quando não
existia transporte de pessoas.
Também no Sertão, o Iphan será o
responsável pela reforma e requalificação das estações de Sousa e São
João do Rio do Peixe, segundo informações do superintendente do órgão na
Paraíba, José Carlos de Oliveira. “Temos um recurso, do DNIT, na ordem
de R$ 1,2 milhão para esse investimento. Esse recurso já entrou e saiu
várias vezes das nossas contas, por falta do projeto de requalificação.
Desde que assumi a superintendência estamos trabalhando para finalizar e
iniciar as intervenções”, disse.
A reportagem buscou a Prefeitura de
Campina Grande (PMCG) para saber se há projetos de reforma e
requalificação da Estação Ferroviária da cidade, mas até o fechamento
desta edição não teve pronunciamento da Secretaria de Comunicação da
cidade.
Na avaliação do superintendente do Iphan,
recuperar as estações de trem é retomar à memória histórica e afetiva
do Estado e suas cidades. “No momento em que requalificamos a estação,
criamos um ambiente propício às recordações de um tempo de crescimento
daquele lugar. É um espaço para repensar a história de crescimento do
futuro com base no passado, retomando o crescimento econômico, social,
político e humano desses lugares. Há cidades, como Sousa, com fortes
potenciais turísticos. A requalificação destes espaços irá desenvolver
ainda mais essas regiões”, disse.
União Europeia aponta que 71% das
emissões totais de CO2 são dos transportes rodoviários. Os transportes
marítimos e aéreos são responsáveis por 14% e 13% das emissões,
respectivamente, e a navegação por vias interiores produz apenas 2%. O
transporte ferroviário é o menos poluente, com emissões inferiores a 1%.
jornal Correio da Paraíba