quarta-feira, abril 03, 2024

Especialista explica diferença entre herança, inventário e testamento.

A advogada Juliana Lira, especialista em direito civil, esclareceu dúvidas sobre herança no programa Arapuan Verdade desta quarta-feira (3), como acompanhou o CIickPB. Ela explicou o que fazer quando um cônjuge ou alguém da família morre, falou sobre as providências no caso de existirem dívidas em nome da pessoa falecida, e explicou ainda qual é a diferença entre herança, inventário e testamento. Entre os exemplos citados, no caso de um casal com cinco filhos, no momento em que um deles morre, ela afirmou que a herança se transmite de imediato para os herdeiros. É preciso, no entanto, observar o regime de bens do casal. Se for o regime de separação de bens, o cônjuge que sobrevive é herdeiro. A especialista frisou também que atualmente o regime mais comum é o da comunhão parcial de bens. Juliana Lira ressaltou que, quando morre um membro do casal, o autor da herança, tem que transmitir de imediato. “Mas, não temos, no Brasil, uma prática de procedimentos de inventário. Então, muitas vezes, pelo senso comum, não é feito o inventário, mas é necessário. Depois que um dos cônjuges morre, o outro não consegue vender casa, comprar carro. O que tiver no nome de um deles, especialmente do que morreu, fica impedido de fazer qualquer negociação antes de terminar o procedimento de partilha para os filhos”. 

Diferença entre herança, inventário e testamento

 De forma didática, como afirmou a advogada Juliana Lira, a herança é o monte patrimonial que uma pessoa deixa quando morre. Todas as pessoas quando morrem deixarão uma herança, independentemente de ter ou não bens porque a herança não é só patrimonial. Ela também é sobre o direito de imagens para uma pessoa que deixou, por exemplo, obras que vão ser divulgadas, e não necessariamente um bem físico, um imóvel ou um carro. Esses outros bens como ações, direitos autorais, tudo isso faz parte da herança. A herança se transmite para os herdeiros da forma legal, do jeito que o Código Civil descreve. “Morreu a pessoa, transmite-se para seus herdeiros. Quem não tem herdeiros pode adotar um planejamento sucessório por meio de um testamento”, observou. 

 Testamento 
O testamento é um instrumento jurídico que o Código Civil apresenta como uma possibilidade de planejar a transmissão da sua herança. “Existe uma série de limitações. O testamento pode tratar sobre tudo que é disponível, que é 50% do nosso patrimônio, é a regra. Cinquenta por cento do que nós temos é disponível para doação ou para testamento. Isso nas hipóteses de pessoas que têm herdeiros necessários, ou seja, um cônjuge, pais ou filhos”, disse a especialista. Ela acrescentou que o testamento pode facilitar o planejamento sucessório. Por meio dele, é possível dispor tanto sobre patrimônio, quanto sobre as nossas intenções de última vontade. Por exemplo, como a pessoa quer o seu sepultamento, se quer ser cremada, se diante de uma doença incapacitante deseja cuidados paliativos ou deseja não ser submetida a determinado tipo de procedimento, caso não possa expressar sua vontade. Tudo isso pode estar dentro do que se chama de atos de última vontade que podem ser dispostos numa escritura de testamento. Além disso, a disposição propriamente sobre os bens. “Qualquer pessoa que tenha capacidade civil plena pode ser autor de um testamento, mas não se pode testar o patrimônio inteiro. Só é passível de ser objeto de testamento o que pode ser doado em vida que é exatamente 50% do seu patrimônio”. Para quem não tem herdeiros necessários, que são cônjuge ou companheiro, filhos ou pais, pode testar 100% do patrimônio para terceiros. Os irmãos são herdeiros colaterais, o que significa que eles não estão na linha obrigatória da sucessão. Caso não haja testamento, os irmãos seriam os herdeiros. A pessoa, quando morre sem deixar herdeiros necessários e sem deixar testamento, a herança se transmite para irmãos e sobrinhos. 

 Inventário 
O inventário é o processo por meio do qual se dá cumprimento a estas disposições, tanto de vontade quanto disposições legais em relação à transmissão da herança. Numa linha cronológica, conforme explicou a advogada Juliana Lira, o autor da herança morre. A herança, do ponto de vista técnico, imediatamente é transmitida para os herdeiros, só que essa transmissão ocorre no plano dos fatos e é preciso que ocorra no plano do direito. “No plano dos fatos porque a pessoa morreu e o bem ficou lá, uma casa, um carro, valores, vários bens móveis dentro da casa e tudo isso precisa ser administrado. De imediato, a herança é transmitida para os herdeiros, mas essa transmissão precisa ser formalizada e o processo que faz essa formalização é o inventário”. Ela destacou que não existe um prazo na lei para fazer o inventário, porém quando passam 60 dias do falecimento, o Fisco Estadual cobra uma multa sobre os impostos que incidem sobre a transmissão. A multa é de 10% sobre o valor do tributo que já é bastante elevado. 

 Comprovação de laços afetivos 
A especialista esclareceu que o Judiciário já tem admitido o reconhecimento pós-morte dessas uniões tanto homoafetivas quanto uniões estáveis no próprio inventário, desde que haja consenso. Se os herdeiros concordam que, de fato, havia uma união que não era regulamentada e querem reconhecê-la no processo de inventário, é possível. Porém, não houver consenso, é necessário que se ingresse com uma ação judicial para o reconhecimento dessa união estável. Esta ação judicial, segundo ela, vai tramitar numa Vara de Família, vai ser necessário produção de provas, oitivas de testemunhas, juntada de documentos para que se configure que o autor de herança tinha uma união que não era regulamentada nem por escritura pública e nem por declaração de vontade. “Não existe um tempo para reconhecimento dessa união. Porém, a jurisprudência construiu essa questão da prescrição do direito de herança em torno de 10 anos. Depois desse prazo, ainda é possível a declaração da existência dessa união estável, porém não para a finalidade de concorrer como os demais descendentes”. 

 Como fazer o inventário 
O processo de inventário, tanto judicial quanto extrajudicial, precisa da assistência técnica de um advogado e a Defensoria Pública também oferece esse serviço na condição de advogado do povo. Caso a renda dos herdeiros não ultrapasse o limite legal para atuação da Defensoria Pública, caso não seja possível contratar um advogado é possível que a Defensoria instrua esse processo e conduza para resolução. No caso de uma família com três herdeiros, todos maiores e entrem num consenso, é possível fazer um inventário extrajudicial que, sem dúvida, é a forma mais fácil e mais rápida, é um inventário amigável. O extrajudicial é feito perante o cartório. 

 Limite de idade para tomar decisões 
Quando filhos não querem deixar os pais tomarem decisões, o que os cartórios – que é onde são feitas essas declarações públicas de vontade – exigem para comprovar a questão da capacidade civil são laudos médicos. O médico, seja um geriatra, psiquiatra ou clínico geral que acompanha o idoso, pode atestar se esse idoso está plenamente orientado em tempo e espaço, e apto ao exercício da vida civil. “O que vemos é que, muitas vezes, o interesse patrimonial, seja dos filhos, seja de terceiros, frente ao idoso, cria esse cenário de insegurança sobre a capacidade civil. Muitas vezes, também existem golpes. Porém, temos que pensar o seguinte: atualmente, o presidente Lula já tem mais de 70 anos, e nós temos, no Tribunal Superior do país pessoas com quase 80 anos atuando, esperando a aposentadoria compulsória com plena capacidade civil e lucidez nas decisões. Então, não necessariamente a idade está relacionada a essa questão”, pontuou a advogada. Assim, segundo ela, é muito complicado estabelecer critérios objetivos em relação a isso. “Recentemente, tivemos uma decisão no STF que deu o que falar para quem gosta de direito de família e pensa nessa questão do golpe do baú. Até então, as pessoas maiores de 70 anos eram obrigadas a casar sob o regime de separação obrigatória de bens. Isso significa que, uma vez casado, o seu cônjuge não tem participação no patrimônio e nem à condição de herdeiro. Essa regra foi feita exatamente para proteger do golpe do baú”, iniciou. Porém, segundo ela, os idosos com mais de 70 anos começaram a mandar no país, começaram a assumir cargos cada vez mais elevados justamente mostrando que não tinham a necessidade dessa tutela protetiva. Essa discussão foi para o STF, sobre se é possível ou não uma pessoa idosa manifestar sua vontade de querer casar sob o regime legal de bens. 

 Herança de dívida ativa 
Quando a pessoa que falece possui uma dívida, essa dívida vai consumir a herança deixada por ela e, para que haja herança para os filhos, o patrimônio deve ser superior à dívida, ou que eles façam adesão a algum tipo de parcelamento ou algo que possibilite o reconhecimento de uma prescrição porque, muitas vezes, essas dívidas de Fazenda municipal , estadual ou federal, o Fisco demora para executar e a dívida prescreve. Em relação a empréstimo consignado, ela verificou que a maioria tem seguro prestamista que cobre o débito diante da morte do mutuário. Se não houver, cria-se um cenário de bastante insegurança jurídica porque para fazer um inventário se exige as certidões negativas de débito fiscal. “Se você estiver limpo na Fazenda municipal, estadual e federal, consegue processar o inventário e transmitir os bens. O credor, seja ele um banco ou uma financeira, tem que procurar esses herdeiros para localizar se existiam bens enquanto o autor da herança era vivo, para ir atrás desse patrimônio. Se for uma dívida com banco, não vai para nenhuma certidão”, completou.