segunda-feira, abril 01, 2024

O SEQUESTRO DO PERU DO PROF . DE TOPOGRAFIA

 Esse episódio ocorreu no Sábado de Aleluia de 1968 . Em Areia , uma " salutar tradição " da Semana Santa , dividia a opinião dos habitantes da cidade .

As mulheres eram contra , os homens em sua grande maioria à favor . Estou falando do sequestro de patos , perus , galos , galinhas , guinés e qualquer tipo de ave comestível . A razão dessa " expropriação " era comemorar o Sábado de Aleluia , emendando com o Domingo de Páscoa , em grande estilo . Dessas expropriações só escapavam urubus e carcarás por motivos óbvios . Algumas pessoas adeptas de uma boa farra , deixavam a ave já amarrada e escondida no quintal de casa , para desespero das mães , irmãs ou esposas que geralmente não concordavam com " essa tradição " . As vezes o quintal de um " velho bem popeiro " era visitado e os comentários e confusões duravam vários dias . A comemoração da Páscoa deveria ser bem grande , gastando - se o mínimo possível .
O " sequestro " das aves , diminuía muito o custo da comemoração . Durante toda Semana Santa , confinavamos em um Cativeiro Secreto , às aves doadas voluntária ou forçadamente para serem abatidas na parte profana da festa . Malhação de Judas , Serrar Velhos ... Dava muita confusão .
Em minhas andanças pela Vila dos Professores na Escola de Agronomia do Nordeste , descobri na casa do Professor de Topografia um peru que mais parecia um avestruz devido o seu tamanho . A " galante " ave estava " peruando " uma linda perua branquinha com cânticos de Glu , Glu , Glu , exibição das penas da cauda e uma " dança de arrodeios eróticos " em volta de uma embevecida perua donzela . Muito exibicionista essa ave ! . Pensei com meus botões : " Vais tomar um banho de colorau , pimenta , sal , vinagre e variados temperos para ficares bem cheiroso além de seres convidado a entrar em um forno para pegares um lindo bronzeado . E estarás pronto para seres o principal convidado em nossa Traquinagem de Páscoa . Esse desejo para se concretizar , precisava de uma esmerada logística . Juntamente com os amigos Leonardo Jardelino e Fernando Eliziário planejamos o
" sequestro " do peru galanteador
Nos sábados pela manhã , o Professor juntamente com sua esposa , vinham a Cidade fazer a feira . A " secretária do lar " da casa do Professor era " paquera " de Fernando Eliziário . Seu Bento Jardelino e Dona Maria Amélia pais de Leonardo Jardelino moravam no Engenho Bujari e aos sábados também vinham a Cidade fazer a feira . O veículo que transportava os Jardelinos era um Jeep Wills modelo 1967 de Capota Branca que apelidamos de " Rato Branco " . Os Jardelinos só retornavam ao Engenho , à tarde . Tudo perfeito para execução do nosso plano .
Leonardo com uma desculpa qualquer pegou o Jeep . Eu e Fernando Eliziário embarcamos no veículo e descemos para a Vila dos Professores na Escola de Agronomia . Cada um com uma missão específica . Leonardo motorista da ação estacionou Rato Branco em uma sombra à 50 metros . Fernando ficaria conversando com a paquera . Eu " convenceria " o peru a dar um passeio em " Rato Branco " . Todo ocorreu conforme o planejado . Não houve intercorrências na ação . Apenas uma pequena relutância do peru em embarcar no veículo e deixar a linda perua solitária no quintal . Subimos para a Cidade e fomos diretos para um
" conceituadissimo " estabelecimento comercial na Rua do Grude , principal artéria da Cidade no comércio de bebidas , comidas e muitas outras mercadorias dentre as quais Carnes Especiais que só podiam ser consumidas " in natura " e
" in loco " . Negociamos o preparo do peru e perguntamos se à partir da meia noite daquele sábado o banquete estaria pronto . Pelo que sabíamos , só se podia beber após Padre Ruy " achar a Aleluia " em alguma página escondida da Bíblia .
A dona do estabelecimento comercial nos respondeu :
" Padre Ruy achou a " Aleluia " antes da meia noite da Sexta feira Santa . Vinte e quatro horas antes do que vocês pensavam . Depois da meia noite aqui chegaram fulano , fulano , fulano e beltrano , todos colegas de turma de vocês e que sabiam que o impedimento para a farra , era até a meia noite da Sexta-feira Santa e não do Sábado de Aleluia . Amanheceram aqui , de véu e capela "
Havia uma crença entre os Católicos e nunca desmentida pela Igreja , de que , se o Padre não " achasse " a Aleluia , o mundo acabaria naquele ano . Ainda , segundo a crença , a " Aleluia " era uma gotícula de sangue escondida em alguma parte da Bíblia . Quando o Padre encontrava , tocavam os sinos , caiam às cortinas roxas que cobriam às imagens dos Santos , cantavam - se hinos de louvores . Era o momento simbólico da Ressurreição ! Momento de Alegria e de Júbilo para todos os Cristãos . Aleluia e Alegria , quer dizer a mesma coisa .
O fato é que havíamos perdido o sábado quase todo , sem saber que podíamos entrar na
" Gandaia " logo nas primeiras horas do referido dia . Tinha problema não ! Ainda tinha o resto do sábado e todo o Domingo de Páscoa . Iniciamos os trabalhos etílicos imediatamente enquanto esperávamos o preparo do peru . A notícia correu e os " penetras " começaram a chegar . Ficou estabelecido que , nós donos do peru , não pagaríamos a bebida . Seria por conta dos
" Convidados e Penetras " .
Além da bebida e dos mais variados pratos , outros produtos existiam que podiam ser consumidos " in loco " e " in natura " . Esses produtos citados por último , não tinham certificados de validade ou de garantia . Consumia - se por própria conta e risco . O consumo desses produtos era incentivado pela alta produção de Testosterona por parte dos jovens adolescentes . O resultado desse consumo era sempre uma despesa extra na farmácia de Seu Nezinho Baracho com as receitas médicas do Dr . Jesus , além dos
" carões " do enfermeiro Seu Pedro Trajano .
Esse episódio , ocorreu há exatos 56 anos , no Sábado de Aleluia de 1968 . São minhas reminiscências do Brejo de Areia dos anos 60 .
AINDA EXISTE ESSA TRADIÇÃO AÍ PELO BREJO , GAROTÕES COM MAIS DE 70 ANOS ?
JOSÉ BARBOSA DE LUCENA
( DR . DEDÉ )