Sempre fui da tese de que a ignorância deve ser combatida com informação e que a arte é um instrumento para que as pessoas se tornem mais sensíveis e percebam o mundo com outros olhos. Mas aqui na Paraíba a ignorância vem sendo alimentada com mais falta de informações e obras de arte passaram a ser alvo de críticas e de desprezo.
No segundo turno das eleições o Estado foi surpreendido com a distribuição de panfletos que disseminam a intolerância religiosa, apontando que o candidato a governador, Ricardo Coutinho (PSB), teria firmado um pacto com o Satanás através de religiões de matriz africana. O absurdo não para por aí: o material ainda diz que o socialista consagrou João Pessoa ao Satanás e, por isso, espalhou “estátuas demoníacas” pela capital paraibana.
Os panfletos, fruto da maldade, só servem para incentivar a ignorância, mas o que me causou mais indignação foi que a “demonização” de obras de artes foi disseminada pelo guia eleitoral de José Maranhão (PMDB). O peemedebista, que disputa à reeleição, faltou com respeito aos artistas, as obras de artes e mostrou total falta de sensibilidade para a cultura. Resta saber se ele foi motivado pela ignorância ou pela maldade.
O que me deixa mais preocupado com isso tudo é que a “demonização” das obras e dos artistas vem fugindo ao controle. Na última quarta-feira o artista plástico Marcos Pinto por pouco não teve a sua obra “Pássaros da Paz” quebrada por supostos manifestantes vestidos de vermelho. A escultura é linda, representa aves de arribação, mas disseminou-se a informação de que ela representaria a Pomba Gira. Além de mentiras a violência também vem sendo disseminada.
Bem, mas como aqui estou em defesa da arte, dos artistas, do livre direito de se expressar e para combater a ignorância com informação vou trazer alguns dados sobre as obras instaladas em João Pessoa que são apontadas como demoníacas:
A obra apelidada de “Porteiro do Inferno” é uma escultura em metal fundido criada na década de 1960 pelo premiado artista plástico campinense Jackson Ribeiro. A escultura se chama apenas "O Porteiro". Jackson Ribeiro é considerado a maior expressão da escultura nacional dos anos 60 e 70, mas morreu em Curitiba em 1997 sem o reconhecimento da sua arte pela Paraíba. Então “O Porteiro” não representa aquele que não precisa de chaves para entrar no Inferno.
O panfleto também fala na escultura “Infeliz das Costas Ocas”, aquela obra de arte instalada na entrada do Bairro de Mangabeira. Na verdade, o nome da escultura é “As Bênçãos a Nossa Senhora das Neves”, de Marco Aurélio Damasceno. A escultura retrata uma imagem católica e fica no trajeto de procissões tradicionais de João Pessoa.
A terceira obra, segundo o panfleto, é a escultura “Cavalo do Cão”, instalada na Cidade Universitária e que representaria a entidade “Pomba-Gira”. O nome da escultura é “Cavaleiro Alado”, de Wilson Figueiredo, que traz através de uma alegoria estilizada, a obra de arte remete a um certo cavaleiro templário e, ao mesmo tempo, traz a figura folclórica de um capitão com sua burrinha num folguedo da dança de um "Cavalo Marinho".
O material apócrifo ainda diz que Ricardo instalou no Lagoa do Parque Solon de Lucena imagem representaria a ascensão de satanás e a derrota das milícias celestes. A bela escultura é chamada “A Pedra do Reino”, uma homenagem ao escritor paraibano Ariano Suassuna que escreveu o romance “A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta”. A obra é do artista plástico Miguel dos Santos.
Para finalizar, o panfleto ainda diz que a estátua em frente ao Bessa Shopping representaria a queda dos anjos de Deus. Na verdade, a escultura é chamada de “Revoar” e é do artista paraibano Luiz Barroso. A escultura representa um pássaro durante o seu vôo. O bico aberto simboliza o canto daqueles que não se deixam calar diante das dificuldades.