segunda-feira, maio 16, 2016

Uma história de luta contra a leucemia e a falta de médicos peritos no INSS.

Descobrir um câncer não é fácil. Conviver com ele menos ainda. Encarar a doença quando não se tem condições financeiras de manter a casa e os gastos que o tratamento traz é um peso difícil de ser suportado. Por isso, os pacientes têm garantido, por lei, o direito a benefícios do INSS, que devem ser pagos de acordo com o seu problema. E o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) deveria ajudar essas pessoas, sem idas e vindas. Contudo, essa não tem sido a realidade de quem procura o órgão no interior da Paraíba.
No município de Casserengue, Agreste paraibano, não há posto do Instituto e, em tese, os moradores deveriam buscar atendimento em Solânea, distante 21 quilômetros. O único problema é que a cidade está há três anos sem médico perito que possa dar encaminhamento aos processos abertos.

Quem conhece de perto a dificuldade de não conseguir atendimento no INSS é a agricultora Solange Macena. Moradora da zona rural de Casserengue, há meses ela se dirige a Solânea em busca de um médico perito que dê um parecer para o caso do seu filho Miguel Macena, de apenas três anos de idade, diagnosticado com leucemia. Mas, além de ter que lutar pela cura da criança, ela enfrenta o calvário de não conseguir o benefício ao qual ele tem direito, por conta da falta do profissional no posto do órgão que fica na cidade.

A peregrinação de Solange começou ainda em fevereiro, quando ela recebeu a notícia que o seu filho tinha a doença. Em junho ela iniciou suas andanças no INSS. No meio do caminho teve que enfrentar uma greve que durou quase dois meses. E, depois do fim da paralisação, ela é obrigada a dar de cara com a estagnação do serviço do órgão público, que não tem funcionários suficientes para atender a demanda de quem mais precisa.

Como se não bastasse o percurso de 160 quilômetros feito toda semana de Casserengue a João Pessoa para tratar Miguel no Hospital Napoleão Laureano, Solange tem que todos os meses se dirigir ao INSS de Solânea em busca do médico perito, sem que em nenhum momento os funcionários do local a informasse que ela nunca iria encontrar o profissional, porque simplesmente o posto do Instituto não o tem.

Segundo a mãe de Miguel, a parte burocrática da papelada está em ordem, faltando apenas o tão sonhado atendimento da consulta com o médico perito. “Dei entrada nos papéis em junho do ano passado e com 15 dias depois o INSS entrou em greve. Depois que voltou a funcionar comecei a ir atrás da perícia médica, mas até agora nada. Eles dizem que não tem vaga. Já faz três meses que vou lá e eles só dizem isso. A demora está sendo do INSS”, contou Solange.

INSS confirma falta de médico perito
O INSS confirmou que há três anos o posto localizado em Solânea está sem médico perito. De acordo com a assessoria do órgão, os moradores da cidade e, consequentemente, de Casserengue devem buscar atendimento no município de Bananeiras. A explicação para a falta de profissional é que muitos estão se aposentando e não houve, nos últimos anos, concurso público para preencher as vagas abertas.

“Está sem perito médico lotado desde 2013 (em Solânea), já que depende da realização de concurso público para a carreira de perito médico previdenciário. A falta dos peritos está sendo em virtude de aposentadoria desses médicos”, explicou a assessoria. Nesse domingo (15) foi realizado o concurso do INSS, inclusive, com vagas para as gerências de João Pessoa e Campina Grande.

Doenças crônicas dão direito a benefício
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Algumas doenças crônicas dão às pessoas doentes o direito a benefícios assistenciais pagos pelo Governo Federal, por meio do INSS. O Coordenador e Professor no Curso de Pós-Graduação em Direito Previdenciário, Theodoro Vicente Agostinho, da Damásio Educacional, explica que crianças também devem ser beneficiadas, como é o caso de Miguel Macena. “Crianças com doenças como câncer, AIDS ou problemas mentais, têm direito a um benefício social, benefícios assistências, independente de contribuição do INSS conhecido popularmente como LOAS, no valor de um salário mínimo, desde que a família comprove que não tem condições de sustentá-la”, disse o especialista.

As pessoas que estão na fila à espera do benefício há muito tempo, como no caso do Miguel, por exemplo, terá o direito ao pagamento retroativo, mas é preciso ficar atento para não perder mais esse direito. “A pessoa deve ficar atenta para que o benefício retroaja a data do requerimento, pois é comum, infelizmente isso não ocorrer. Caso ele não receba, é importante a ajuda de um profissional especializado”.

Esses benefícios, conforme o especialista, pode ter variação de valores, a depender do problema do paciente.  “Benefícios assistenciais pagam um salário-mínimo. Já o Auxílio-Doença será um percentual de 91% das últimas doze contribuições (média) e a Aposentadoria Por Invalidez será 100% da média das 80% melhores contribuições de 07/1994 para cá”, explica o professor.

Theodoro Vicente Agostinho alertou, ainda, que as pessoas que tiverem seu pedido de benefício negado podem e devem recorrer. “Em princípio os interessados podem se dirigir a qualquer agência do INSS, ou então, ligar no 135. Caso seu pleito não seja atendido, ou eventualmente negado, ou ainda, se restarem dúvidas, recomendamos que procure um advogado especializado em Direito Previdenciário a fim de obter o direito”, orienta o especialista.

O drama da luta
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No caso de Miguel, o benefício seria a saída para encarar a doença com um pouco mais de dignidade. O pai dele tira o sustento da família na agricultura. A mãe é beneficiária do programa Bolsa Família, mas esses meios de vida não dão suporte para alimentação e despesas dos medicamentos de Miguel e do seu irmão de 10 anos. “O que nos ajuda no dia a dia é a doação de uma cesta básica e oito latas de leite especial para Miguel feita pela Casa da Criança com Câncer da Paraíba no início de cada mês”, contou.

É na esperança de obter essa vida mais digna para o filho que Solange garante não deixar de lutar para conseguir o beneficio junto ao INSS. Miguel, ainda não estuda, aproveita seus dias brincando com os colegas sempre com uma máscara no rosto para não ter contato com a poeira.

“Na minha cabeça câncer era morte, mas o meu filho está reagindo bem, com todas as dificuldades tenho a certeza de vencer essa batalha. Aos poucos estou explicando ao meu filho o seu problema de saúde, no momento certo irei falar para ele a sua luta para vencer o câncer”, se emociona.

Jornal Correio da Paraíba