Descobrir um câncer não é fácil. Conviver
com ele menos ainda. Encarar a doença quando não se tem condições
financeiras de manter a casa e os gastos que o tratamento traz é um peso
difícil de ser suportado. Por isso, os pacientes têm garantido, por
lei, o direito a benefícios do INSS, que devem ser pagos de acordo com o
seu problema. E o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) deveria
ajudar essas pessoas, sem idas e vindas. Contudo, essa não tem sido a
realidade de quem procura o órgão no interior da Paraíba.
No município de Casserengue, Agreste
paraibano, não há posto do Instituto e, em tese, os moradores deveriam
buscar atendimento em Solânea, distante 21 quilômetros. O único problema
é que a cidade está há três anos sem médico perito que possa dar
encaminhamento aos processos abertos.
Quem conhece de perto a dificuldade de
não conseguir atendimento no INSS é a agricultora Solange Macena.
Moradora da zona rural de Casserengue, há meses ela se dirige a Solânea
em busca de um médico perito que dê um parecer para o caso do seu filho
Miguel Macena, de apenas três anos de idade, diagnosticado com leucemia.
Mas, além de ter que lutar pela cura da criança, ela enfrenta o
calvário de não conseguir o benefício ao qual ele tem direito, por conta
da falta do profissional no posto do órgão que fica na cidade.
A peregrinação de Solange começou ainda
em fevereiro, quando ela recebeu a notícia que o seu filho tinha a
doença. Em junho ela iniciou suas andanças no INSS. No meio do caminho
teve que enfrentar uma greve que durou quase dois meses. E, depois do
fim da paralisação, ela é obrigada a dar de cara com a estagnação do
serviço do órgão público, que não tem funcionários suficientes para
atender a demanda de quem mais precisa.
Como se não bastasse o percurso de 160
quilômetros feito toda semana de Casserengue a João Pessoa para tratar
Miguel no Hospital Napoleão Laureano, Solange tem que todos os meses se
dirigir ao INSS de Solânea em busca do médico perito, sem que em nenhum
momento os funcionários do local a informasse que ela nunca iria
encontrar o profissional, porque simplesmente o posto do Instituto não o
tem.
Segundo a mãe de Miguel, a parte
burocrática da papelada está em ordem, faltando apenas o tão sonhado
atendimento da consulta com o médico perito. “Dei entrada nos papéis em
junho do ano passado e com 15 dias depois o INSS entrou em greve. Depois
que voltou a funcionar comecei a ir atrás da perícia médica, mas até
agora nada. Eles dizem que não tem vaga. Já faz três meses que vou lá e
eles só dizem isso. A demora está sendo do INSS”, contou Solange.
INSS confirma falta de médico perito
O INSS confirmou que há três anos o posto
localizado em Solânea está sem médico perito. De acordo com a
assessoria do órgão, os moradores da cidade e, consequentemente, de
Casserengue devem buscar atendimento no município de Bananeiras. A
explicação para a falta de profissional é que muitos estão se
aposentando e não houve, nos últimos anos, concurso público para
preencher as vagas abertas.
“Está sem perito médico lotado desde 2013
(em Solânea), já que depende da realização de concurso público para a
carreira de perito médico previdenciário. A falta dos peritos está sendo
em virtude de aposentadoria desses médicos”, explicou a assessoria.
Nesse domingo (15) foi realizado o concurso do INSS, inclusive, com
vagas para as gerências de João Pessoa e Campina Grande.
Doenças crônicas dão direito a benefício
Algumas doenças crônicas dão às pessoas
doentes o direito a benefícios assistenciais pagos pelo Governo Federal,
por meio do INSS. O Coordenador e Professor no Curso de Pós-Graduação
em Direito Previdenciário, Theodoro Vicente Agostinho, da Damásio
Educacional, explica que crianças também devem ser beneficiadas, como é o
caso de Miguel Macena. “Crianças com doenças como câncer, AIDS ou
problemas mentais, têm direito a um benefício social, benefícios
assistências, independente de contribuição do INSS conhecido
popularmente como LOAS, no valor de um salário mínimo, desde que a
família comprove que não tem condições de sustentá-la”, disse o
especialista.
As pessoas que estão na fila à espera do
benefício há muito tempo, como no caso do Miguel, por exemplo, terá o
direito ao pagamento retroativo, mas é preciso ficar atento para não
perder mais esse direito. “A pessoa deve ficar atenta para que o
benefício retroaja a data do requerimento, pois é comum, infelizmente
isso não ocorrer. Caso ele não receba, é importante a ajuda de um
profissional especializado”.
Esses benefícios, conforme o
especialista, pode ter variação de valores, a depender do problema do
paciente. “Benefícios assistenciais pagam um salário-mínimo. Já o
Auxílio-Doença será um percentual de 91% das últimas doze contribuições
(média) e a Aposentadoria Por Invalidez será 100% da média das 80%
melhores contribuições de 07/1994 para cá”, explica o professor.
Theodoro Vicente Agostinho alertou,
ainda, que as pessoas que tiverem seu pedido de benefício negado podem e
devem recorrer. “Em princípio os interessados podem se dirigir a
qualquer agência do INSS, ou então, ligar no 135. Caso seu pleito não
seja atendido, ou eventualmente negado, ou ainda, se restarem dúvidas,
recomendamos que procure um advogado especializado em Direito
Previdenciário a fim de obter o direito”, orienta o especialista.
O drama da luta
No caso de Miguel, o benefício seria a
saída para encarar a doença com um pouco mais de dignidade. O pai dele
tira o sustento da família na agricultura. A mãe é beneficiária do
programa Bolsa Família, mas esses meios de vida não dão suporte para
alimentação e despesas dos medicamentos de Miguel e do seu irmão de 10
anos. “O que nos ajuda no dia a dia é a doação de uma cesta básica e
oito latas de leite especial para Miguel feita pela Casa da Criança com
Câncer da Paraíba no início de cada mês”, contou.
É na esperança de obter essa vida mais
digna para o filho que Solange garante não deixar de lutar para
conseguir o beneficio junto ao INSS. Miguel, ainda não estuda, aproveita
seus dias brincando com os colegas sempre com uma máscara no rosto para
não ter contato com a poeira.
“Na minha cabeça câncer era morte,
mas o meu filho está reagindo bem, com todas as dificuldades tenho a
certeza de vencer essa batalha. Aos poucos estou explicando ao meu filho
o seu problema de saúde, no momento certo irei falar para ele a sua
luta para vencer o câncer”, se emociona.
Jornal Correio da Paraíba