Certa vez um jovem médico , foi procurado por um viúvo sessentão que havia se 
" enrabichado " por uma 
" fogosa mulher de trinta anos ".
    A conduta de sua jovem companheira , deixava margem a especulações .
Seria doença ? Seria " encosto " ?
Seria vigarice ?
Eis o relato " Ipisi Literis " do desditoso Romeu :
    - Dotô , derna qui me ajuntei cum minha Muié , ela começou a aparecer cum uns pantins...! Se ela pidi aiguma coisa e eu num dé , ou mermo demorá a dá , ela dá uns gritos , uns pinotes , abre o berreiro maió do mundo e cai prá riba duma cama toda se tremendo , cum os óio arregalado desse tamanho , piscando qui nem aive de natá .
    Se eu num chegá logo cum o dinheiro , ou mermo o objeto qui ela pediu , fica têzinha in riba da cama , sem arreconhecê ninguém . 
-
Teve vei , qui ela passou o mei todin  cum um lundum tão danado , sem querê nem uma camaradagenzinha cum eu . Agora ... deu o qui ela qué ... fica boazinha , na hora !
    Faz dois ano , qui a pisadinha é essa ! Quando dá essa Caicanga nela , eu corro pru hospitá , pru catimbozeiro , prá rezadeira , pago consulta , compro remédio , meizinha , garrafada e nada se arrezorve . Se num dé o qui ela qué , num tem boquinha não... E lá se vem outra gastação . Vou na loja , compro o qui ela pediu e pronto... ! Acabou a confusão pru uns dias . Tem inté , umas camaradagenzinha cum eu . 
 O médico atencioso , escuta o drama do camponês .
    - E tem mais Dotô ,  Já fui um home rico . Era dono de uma propriedadezinha no brejo . Só aprantava , coisa prá rico cumê . Num niguciava cum miunçaiazinha de pobre não ! Eu aprantava era uva , mamão , melão , melancia , pinha , sapoti , graviola , só coisa cara , prá gente granfina cumê !
    Num tô nem contando cum uns criatoruzinho qui eu tinha in redor de casa . Tinha vaca e cabra leiteira , bode e carneiro de raça , poico gordo , peru , galinha , guiné e pato . Barreirinho cheinho de peixe .
Inté mé de abeia , tinha !
    Prá transportar minha produção pras feiras , eu tinha uma Fó Roquete , um Mei Caminhão Istudibeique , um Chevolé 58 , um Fenemê muito macho . Carro de passeio , eu tinha um Gordin , um Eruiles , uma Rurá 68 e uma Aivorada pai d'egua , tudin , pegando na chave sem pricizá de impurrão . 
    Fora isso , tinha um bucadim de vintém no Banco do Brazi e na Caixa Inconomica Fiderá . 
O ancião deu uma pausa , respirou fundo , e recomeçou seus rosários e ladainhas de penúrias .
    Dotô , esse meu patrimônio foi desmilinguindo , desmilinguindo , inté eu ficá de nada prá acabou-se e cum uma mão na frente e outra atrais  .
    De valô hoje , só tenho uma carroça véia , um burro mulo espaduado , duas cabras maninha ,  a Taperinha de morada , uma vaca cum um peito perdido , um viralata sarnento ,  uma gata parideira e ladrona , meia língua de terra , um tacho de cobre furado , um pinico de loiça qui herdei de minha vó, um galo cego amigado cum uma sem-veigonha de uma papagaia perneta pru farta de galinha no terreiro .
    E o calvário do sexagenário parece não ter fim .
    - Dotô ,  além dela cumê tudo qui eu tinha , qui nem firida braba , disse a Deus e ao mundo , qui só saía de minha vida , curada ! Pois eu tinha tirado ela da casa dos pais dela , ENCABAÇADA e sem problema de NEUVO . Tinha dereito a uma indenização gorda . Já tinha falado cum um advogado . Vê se pode Dotô ? Tô dizisperado e num sei mais o qui faça . 
Ando discunfiado qui pulo gosto dela , eu passava minha linguinha de terra nos cobres ( vendia ) e dava tudim a ela , pru mode ela gastá , se amostrando nas lojas do chopi .
    A princípio , o jovem Esculápio, pensou tratar-se de epilepsia ou mesmo , crises histéricas , entretanto , com o desenrolar da trama , foi associando fatores como diferença de idade , só caía sobre cama fofa e nunca se feria nesses eventos , a chantagem sexual ( ela era como político do CENTRÃO ) , só dava se recebesse algo em troca . E começou a desconfiar de VIGARICE RECORRENTE . Pediu que o matuto fosse com ela ao consultório , para melhor avaliação . 
E assim foi feito . 
    Após um mês de exames , aconselhamentos , medicação e sem que existisse nenhum indício de melhora , o médico jogou a toalha . Desistiu do caso . Antes , aconselhou o velho caipira .
    - Caro amigo , meu pai dizia , que " Dinheiro e Cacete , resolve qualquer coisa no mundo "  Se não resolver , é porque foi pouco . Seu dinheiro já acabou , não foi ? 
    - Foi Dotô ! Respondeu o ruricola  desolado . - Você  tem algum amigo  que tem um problema semelhante e a mulher ficou curada ? - Tem Dotô ! - Peça uns conselhos a esse amigo prá ver o que ele diz ...                                                          O pobre matuto voltou prá casa matutando sobre aquela história de 
" DINHEIRO E PÉÉÉIIIAAA " . 
 Passou-se alguns anos , e o médico esqueceu o caso . 
    Certo dia , foi surpreendido na feira com o efusivo abraço que o matuto lhe deu e que foi logo  dizendo :
-  Dotô , graças primeiramente a Deus e sigundamente ao sinhô , minha cabrocha tá curada . Tô ficando rico de novo ! Apariceu inté um gruguelinho novo lá in casa , adispoi qui a Muié ficou boa .
-- Mas como é que o senhor está me agradecendo , se eu não passei nenhuma medicação para ela , depois que desisti do caso ?
- Dotô , as veis um conseio é mió de que remédio . E aquele seu conseio , foi um santo remédio . Muito obrigado , Dotô ...!
    E o médico ficou tentando se lembrar qual tinha sido o conselho milagroso... 
 JOSÉ BARBOSA DE LUCENA 
 ( DR . DEDÉ )
