Só 105 municípios têm base. Faltam infraestrutura, médicos e até segurança para
as equipes; serviço não chega em todas as áreas e, onde vai, demora mais que o ideal... Mas ele vem chegando tarde demais, ou nem chega.
Na Paraíba, menos da metade dos municípios têm bases
e o programa funciona com
dificuldades, mesmo onde
tem. Às vezes, o radio comunicador não funciona, outras
a ligação cai em outro Estado e ainda tem áreas onde as
ambulâncias percorrem longas distâncias, quando não
estão nas oficinas.
E os problemas não se resumem à infraestrutura: faltam médicos em alguns
locais; em outros, as equipes só saem escoltadas pela
polícia. Sem contar que são poucos os hospitais aptos a
atender as ocorrências. Ah,
e tem ainda os trotes... A lista de problemas não cessa. Uma coisa é certa: é preciso
resgatar o Samu.
SERVINDO DE TRANSPORTE...
Para a maioria dos municípios, o Samu é o quebra-galho de hospitais com serviços
incipientes. Onde não há especialidades, a ambulância
serve para transferir pacientes de uma cidade a outra.
Em Princesa Isabel, por
exemplo, há um hospital
regional, mas, segundo o
coordenador do Samu no
município, não há nenhuma
especialidade na unidade,
que presta o segundo atendimento apenas com um clínico geral, que encaminha
para os grandes centros, distantes. “Toda ocorrência de trauma tem que ir para Patos
ou Campina Grande, distante
duas horas e quatro horas”,
disse Leonardo Campos.
Se a ocorrência for em Manaíra, segundo Leonardo, é
necessário uma hora para ir
e voltar.
Dos 223 municípios da Paraíba, a maioria ainda não
tem base própria. O município mais distante, Imaculada,
fica a cerca de 73 km. O Samu
chega em 50 minutos, com as
boas condições da estrada.
Se uma pessoa sofrer um infarto nesse local, o Samu não
conseguirá chegar a tempo.
CORRIDA E LUTA PELA VIDA...
A equipe do Correio da Paraíba acompanhou uma equipe do Samu em atendimento.
Segundo a assessoria, todos
os chamados telefônicos dá
macro região 1 são atendidos
por uma equipe com sete técnicos, que colhem as primeiras informações e repassam
para um dos quatro médicos
reguladores de plantão, que
prestam as primeiras orientações e acionam a ambulância se necessário.
O senhor de 59 anos foi
encontrado caído pela filha,
que ligou para o Samu. Ao
chegar ao Trauminha, a médica do Samu entregou o paciente aos cuidados da equipe médica, do hospital.
A maca ficou presa por um
tempo, mas como havia suspeita de Traumatismo Craniano Encefálico na queda, e
não havia neurologistas no
local, a equipe do Samu foi
acionada novamente para
buscar o homem e levá-lo até
o Hospital de Trauma, para
realização de exames e consulta.
“POPULAÇÃO PRECISA AJUDAR”
Segundo a coordenadora
de Urgência e Emergência
da Central de Regulação em
Monteiro, Adalgisa Gadelha,
todos os municípios cumprem a contrapartida, que é
manter as bases descentralizadas. Mas, segundo ela, é
necessário uma mãozinha da
população nesse processo.
“A população precisa ajudar, porque muita gente liga
para o 192, mas não entende
a função do Samu. A maior
parte das ocorrências são sociais. Por exmeplo, pessoas
que não têm como chegar ao
hospital ou até mesmo um
caso clínico que poderia ser
resolvido em uma unidade
de saúde. Isso sem contar na
média de dois mil trotes que
recebemos em seis meses”,
concluiu Adalgisa.
Monteiro reflete uma parte
da realidade do serviço no
Estado, mas em outras regiões também há problemas.
Na macrorregião de João Pessoa, a demora no atendimento também existe. Há
pouco mais de um mês, um
funcionário público federal
morreu vítima de um infarto
enquanto esperou mais de
40 minutos pelo Samu.
Na época, o coordenador
administrativo do Samu na
Capital, Humberto Nascimento, falou ao Correio da
Paraíba que o atendimento médico ocorre entre cinco e
dez minutos após o chamado.
No caso específico em
que o funcionário público
chegou a falecer, não havia
ambulância disponível no
momento. No entanto, uma
motolância foi enviada, mas
parou durante o percurso
para atender um acidente de
trânsito.
PRIORIDADE NA ROLETA RUSSA...
Para a coordenadora de Urgência e Emergência da SES,
Rafaella Keyla de Medeiros, o
atendimento está priorizando
o risco iminente de morte. “O
que está matando hoje na Paraíba são infarto e AVC. É uma
demanda altíssima de óbitos. A população precisa ajudar.
Às vezes deixamos de atender uma urgência com risco
porque tem gente que chama
o Samu por uma dor de cabeça ou par a med ir pressão. Diz
uma coisa e quando a equipe
chega é outra realidade”, declarou.
“Estamos trabalhando linhas de cuidados prioritários (cardiologia, neurologia
e ortotraumas), para que um
hospital em cada macrorregião atenda todas as especialidades. Temos 33 hospitais
estaduais que recebem socorridos, além dos municipais,
mas ainda estamos determinando quais têm porte para
atender essas especialidades”, afirmou Rafaella.
Outros gargalos atrapalham
o programa de funcionar de
forma plena. “Os hospitais
superlotados, acabam retendo as macas e a viatura não
pode fazer socorro. Em João
Pessoa, isso diminuiu bastante com a reforma do Trauma,
mas é uma dificuldade em
todo o Brasil. Em relação às
transferências, Rafaella alegou que as UPAs tem ambulâncias próprias. “A maioria
dos hospitais estaduais tem
ambulância, são os dos municípios que não têm”, disse.
DISTRIBUIÇÃO ESTRATÉGICA...
Para dar agilidade, as ambulâncias são espalhadas
em pontos estratégicos na
Capital. “Em João Pessoa,
temos veículos nos bairros
de Cruz das Armas, Valentina e no Hospital Santa
Isabel”, ressaltou a coordenadora de Urgência e Emergência.
Rafaella falou sobre a responsabilidade dos municípios. “A União entra com
50% dos recursos, o Estado
25% e as Prefeituras, 25%.
É preciso interesse dos gestores, fi ca difícil gerenciar
essa situação. Estamos fazendo relatório de todas as bases para saber quem está
irregular, até o fi m do mês
estará pronto”, concluiu.
HOSPITAIS SIM,
VAGAS NÃO...
Em João Pessoa, a situação
inversa ocorre. Há hospitais
de referência, mas por receberem grande fluxo de outros municípios, faltam vagas.
“Essa é a grande dificuldade,
porque João Pessoa tem que
absorver a demanda dos municípios que não tem locais de
referência, o que sobrecarrega a rede. O problema não são
os hospitais daqui, são os do
interior, se fosse só para cá
sobrariam vagas. Se não há
vaga, o hospital tem que arrumar com a vaga zero ou emergencial, pois ele não pode ficar
na ambulância e se ficar em
casa, morre” disse o coordenador geral, Márcio Gomes.
Outro problema relatado
pelo médico cirurgião são as
macas retidas. “Tem melhorado muito, mas há alguns
meses, já tivemos até 10 macas retidas, parando o serviço”, disse. Sobre a demora no
atendimento, o coordenador
afi rmou que isso ocorre quando há excesso de chamados
ou em horário de pico.
COMUNICAÇÃO
AINDA PRECÁRIA
Radio comunicadores não funcionam. Em algumas áreas nem por telefone serviço é acessado...
Em cidades do Cariri do Estado, o funcionamento de um
serviço tão essencial enfrenta dificuldades que começam
pela comunicação. Em Monteiro, enfermeiros reclamam
que os radiocomunicadores
(HTs) não funcionam em
determinadas localidades
de zona rural. Como em algumas situações é preciso
se comunicar com o médico, que fica na base, o celular acaba sendo a única saída para
conclusão do atendimento
rápido. Só que nem sempre
há sinal de telefone, e quando
há, surge um novo problema.
“Fomos em um sítio chamado Limitão de Cima, e os
rádios não conseguiam comunicação com a central.
Cheguei em uma casa que tinha uma antena de telefone,
e pedi para fazer uma ligação.
Que era, no caso, a ligação
para o 192. Liguei e caiu no
Samu Agreste, que fica em
Garanhuns, Pernambuco. Já
pensou na dificuldade que é?
Às vezes, o atendimento é tão
distante, que a ligação cai em
outro Estado”, conta o condutor Fagundes da Silva.
As dificuldades ainda são
maiores para as cidades de
Sumé e Livramento. Em Sumé, distante 130 quilômetros
de Campina Grande, os radiocomunicadores não funcionam há três meses e seis
equipes dividem um único
telefone celular. A coordenadora do Samu da cidade disse
que um problema na repetidora deixou todas as cidades
que compõem a região sem
comunicação.
“O nosso HT não funciona.
E não está funcionando há
mais de três meses. A gente
tem um celularzinho que é da
equipe, e a Central se comunicam conosco a partir dele.
É ruim porque a gente depende de uma linha telefônica
que às vezes está ocupada, e
se o sinal cai, não tem contato. Era pra ser um recurso
extra, mas acabou virando o
único recurso. Informamos à
Central e foi informado que é
um problema na repetidora,
então estamos nós e todos os
municípios da região sem comunicação. Se a Central tiver,
é somente entre a modulação
deles”, explicou Veridiana. Se
em Sumé, os rádios estão sem
funcionar há três meses, em
Livramento os equipamentos nunca funcionaram.
EQUIPES SÓ SAEM ESCOLTADAS PELA POLÍCIA
Em casos de surto psicótico, ferimento de arma branca
ou arma de fogo, o Serviço só
chega à casa do paciente se
estiver escoltado pela Polícia
Militar. Em Monteiro, socorristas às vezes sofrem ameaças de morte por causa da
demora. “Houve ocorrência
de a gente ir prestar atendimento em uma tentativa de
homicídio no Congo, e eles
ligaram pra cá dizendo que,
se alguém fosse prestar socorro, fosse acompanhado,
porque eles iriam terminar o
serviço. E nossa ambulância
foi escoltada com duas viaturas da Polícia”, conta a enfermeira Cláudia Alves.
O Samu havia acabado de
ser inaugurado, quando a
equipe recebeu um chamado
às 11h. O caso era de um ferido por ar ma de fogo na Vila
Santa Teresa, região de tráfico de drogas. “Liberamos a
USA com médico, enfermeiro
e condutor. Ligamos pra PM
e disseram que a gente podia
ir porque a Polícia já estava
no local. A PM não estava.
Decidimos aguardar porque
quem atirou poderia estar lá.
A população sacudiu a ambulância de um jeito que a gente teve que descer na hora”,
lembrou.
Agora, a espera pelas viaturas da Polícia Militar em
Monteiro, que ficam na saída
para Sertânia (PE), tem nova
estratégia. As ambulâncias
só saem da base do Samu,
depois que a PM atende.
NÃO HÁ MÉDICOS, NEM USA
Nos municípios menores, o
problema se agrava porque
falta ambulância para transportar gente. Em Sumé, a única ambulância do Samu está
quebrada há mais de uma
semana, depois de uma pane
no circuito elétrico do veículo. Cidades do entorno como
Congo e Amparo ficaram descobertas por dois dias. Só no
último domingo que a cidade
conseguiu uma ambulância
reserva de Monteiro.
Assim como em Sumé, em
Livramento também não há
médico, nem ambulância
avançada. As bases funcionam com um enfermeiro, um
técnico e um condutor socorrista. As ambulâncias são para casos básicos, ou seja, não
há ventilador mecânico nem
desfibrilador manual. Quando algum paciente da região é
diagnosticado com infarto ou
AVC, a única ambulância avançada de Monteiro é acionada.
Em Serra Branca, o Samu
funciona na área do Hospital
Geral. No Local, funcionários
informaram que nenhum socorrista estava trabalhando
naquele dia, porque a ambulância está quebrada desde
terça-feira. Nem enfermeiro,
nem técnico, nem condutor
estavam trabalhando. O Correio ligou na sexta-feira por
volta de meio dia, e o Hospital
informou que ninguém estava trabalhando novamente.
AJUDA DA POPULAÇÃO
Além dos problemas de infraestrutura e funcionamento, para que o atendimento
seja correto, é preciso que
usuários do serviço se conscientizem da importância
do repasse de informações
corretas. Funciona como um
trabalho em conjunto entre
socorristas e família de pacientes . Detalhes do problema
devem ser repassados, porque
assim os atendentes vão definir se é necessária a presença
de um médico, ou de equipamentos mais avançados.