sábado, maio 07, 2016

Humilhação, dor e machismo no parto... Jornal Correio deste domingo...

25% das brasileiras sofrem violência obstétrica afirma pesquisa. No Nordeste são 27%. Esse tipo de violência ocorre no serviço público e na saúde particular. Médicos ainda fazem o corte do períneo para facilitar a saída do bebê e ironizam: “É o ponto do marido”.

“O pré-natal foi saudável, ganhei o peso esperado, era de baixo risco. A obstetra assinou e carimbou o plano de parto, concordando com todos os itens, e não foi cumprido. Eu queria ter meu fi lho de forma natural, sem nenhuma intervenção. Tive um sangramento e por orientação da ginecologista fui para a maternidade quando as contrações eram a cada dois minutos. Meu marido e a doula foram comigo”, contou. Pamela classifi ca o próprio parto como show de horrores. “O primeiro sinal de violência obstétrica foi que todo o hospital estava me olhando quando fui internada e o médico examinou a dilatação. Eu vomitei de dor e a obstetra me medicou para não vomitar. Com oito centímetros de dilatação eu estava feliz e ansiosa pela chegada do meu bebê. Para a médica estava demorando muito e sem me avisar, rompeu minha bolsa e disse que ia me dar uma “ajudinha”. Forçou a dilatação do meu colo do útero com seus dedos, causando uma dor mais forte que a contração. Eu sequer sabia o que estava acontecendo”.

O sofrimento de Pamela não parou por aí. Com 10 cm de dilatação ela foi levada ao bloco cirúrgico. “Fui colocada em uma maca tão estreita que eu mal podia me mexer. Meu marido chegou e me pediram para deitar em posição de litotomia (de barriga para cima). Eu pedi quase chorando que não, e alguém me empurrou para baixo. Eu deveria segurar uma barra de ferro e fazer força quando as contrações viessem. A pediatra e uma enfermeira fi zeram força na minha barriga (manobra de Kristeller). Então recebi ocitocina na veia, contra a minha vontade. Foi uma dor terrível. Sei que eu não fui a primeira e infelizmente não serei a última mulher a passar por isso, mas falar sobre esse assunto pode prevenir que outras mulheres passem. Eu só queria parir meu fi lho onde eu quisesse como a médica prometeu”, desabafou. Um ano depois, Pamela escreveu uma carta à médica, mas, nunca entregou. O relato foi lido na Câmara de Vereadores. Ela não quis acionar a Justiça, mas denunciou no site do MPF no fi m do ano passado, nunca obteve retorno. “Não foi a cicatriz física que me doeu, foi saber que fui violentada.

É muito difícil. E ainda recebi o ‘ponto do marido’. Foram tantos pontos que dois meses depois, ainda caía. Tive um sangramento no meu útero. Meu corpo rejeitou os pontos. Só cinco meses depois consegui ter relação com meu marido e senti tanta dor que chorei e desisti. Espero que um dia, ao lembrar-me do nascimento do meu fi lho, eu não me recorde com mágoa e tristeza, mas só veja a grandeza de trazer um ser ao mundo novo”, concluiu.
-



-

O meu maior pesadelo foi quando ela disse que precisava fazer um cortezinho. Antes de eu responder, ela fez. Eu não estava anestesiada. Senti aquela tesoura gelada no meu períneo me rasgando. Pedi para a pediatra ler meu plano de parto porque não queria várias intervenções desnecessárias no meu fi llho. Ela disse: ‘aqui é do meu jeito, aplico colírio, aspiro e faço tudo’. Levou meu bebê...

Pamela Siqueira, blogueira

Riscos à mãe e ao bebê... 
Empurrar a barriga não é normal. Obstetra diz que ‘manobra de Kristeller’ pode romper fígado da mulher e causar lesões na criança... Fisiologicamente, não é necessário forçar o nascimento do bebê. Nos casos em que for necessário alguma intervenção ou até mesmo a mudança para indicação de cesariana, o médico deve seguir uma série de protocolos. Intervenções desnecessárias acarretam riscos para a mãe e a criança, segundo o obstetra Eduardo Sérgio. “Empurrar a barriga pode romper o fígado da mulher e causar lesões no bebê”, alertou. Uma episiotomia mal cicatrizada pode requerer cirurgia plástica reparativa. E o medo do sofrimento pode levar as mulheres a recorrerem à cesárea. Métodos naturais. O diretor técnico da maternidade Cândida Vargas, Juarez Alves Augusto, justificou que não há como controlar todos os profissionais. “São 80 obstetras. Não posso dizer que todos se comportam da mesma maneira. Não temos nenhum caso absurdo. Todas tem direito à acompanhante, do pré-parto ao puerpério. Além disso, temos métodos naturais de facilitação, como o cavalinho, a bola, a barra e as doulas, tudo visando minimizar o desconforto”, elencou o médico.