domingo, março 13, 2016

Estupro: mais de 130 crianças são vítimas em 1 ano, na PB.

Casos são uma amostragem e referem-se a inquéritos concluídos, envolvendo menores de até 14 anos, em 10 municípios paraibanos... Em uma casa pobre, na zona rural de um município no Agreste paraibano, Marina (*fictício) morava com os pais, três irmãs e o cunhado. Sem muitos brinquedos e espaço de lazer, a distração da menina era ficar no roçado brincando com os animais do sítio, até que em 2014, com 10 anos, ela foi abusada sexualmente pelo cunhando, de 28 anos. Sob ameaças, a menina sofria calada e os abusos continuaram até março do ano passado, quando então com 11 anos, ela foi estuprada por outros três homens, um deles o padrinho. Os quatro acusados chegaram a ser presos, mas aguardam o julgamento em liberdade. O caso de Marina está entre as 139 vítimas, com idade de 0 até 14 anos, que foram estupradas em 10 municípios da Paraíba, em 2015. 

Os dados referem-se aos inquéritos concluídos a respeito do crime de estupro de vulnerável, quando a vítima tem até 14 anos, e foram levantados pela reportagem nas Delega- cias da Mulher de oito cidades e nas delegacias de Repressão aos Crimes contra a Infância e Juventude de João Pessoa e de Campina Grande. Conforme as informações repassadas pelas delegadas, a maior parte das vítimas é do sexo feminino e tem entre 9 e 13 anos. Contudo, também há casos de estupro em crianças menores de 5 anos.

 “Esse tipo de crime acontece mais dentro da própria família da criança. Quando não é o padastro, é um vizinho e até mesmo o pai. Geralmente, são pessoas próximas à convivência da criança e sem qualquer suspeita”, explicou a delegada da Delegacia de Repressão aos Crimes contra a Infância e Juventude da capital, Graça Morais. 

Outra situação comum nesse tipo de crime é a demora nas denúncias, o que pode livrar o suspeito do flagrante. Segundo a delegada, geralmente, a situação de ameaça sofrida pelas vítimas contribui para que os casos só cheguem ao conhecimento da polícia anos depois. Foi o que aconteceu com Mari- na e também com Sofia (*Fictício). A garota era abusada pelo pai desde os 9 anos e no último mês de janeiro, quando ele ten- tou consumar o ato sexual com a menina, hoje com 13 anos, ela conseguiu fugir e contar aos familiares o que acontecia. 

“Os pais eram separados e ela passava os finais de semana na casa do pai e vivia essa situ- ação desde os nove anos. Como ela não tinha uma formação psicológica resolvida para ver que aquilo era errado, ela não contava a ninguém. Mas, conforme ela foi ficando adolescente, e percebeu que era uma vítima, ela contou para a família no dia que ele tentou a penetração”, disse a delegada. 

O caso de Sofia soma-se a outros três inquéritos que investigam estupro de vulnerável em crianças e adolescentes que foram registrados este ano na capital.
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Criança que é violentada muda o comportamento,,,
“A menina contou que começou a tirar notas baixas, ficava sempre triste e, de repente, começou a andar com uma faca dentro da bolsa para cortar os pulsos, porque ela não podia expor aquele sofrimento que estava passando”. A fala da delegada de Repressão aos Crimes contra a Infância e Juventude da capital, Graça Morais, refere-se ao depoimento de uma adolescente de 13 anos, que era abusada pelo padrasto desde os 8 e revelou o caso à família em janeiro deste ano. As marcas ferem o corpo e também a alma, deixando sequelas emocionais difíceis de serem curadas, esquecidas. Insônia, distúrbios alimentares, insegurança e isolamento social estão entre os sinais de uma criança ou adolescente que sofre violência sexual. “Quanto menor for a criança, mais ela vai fazendo parte daquilo e, pela ingenuidade natural que é própria dela, nem se dá conta que está sofrendo uma violência. Muitas vezes a criança é ameaçada psicologicamente e essa violência maltrata muito e não deixa a criança em paz. Então, essa criança ou adolescente dá sinais corporais, emocionais, comportamentais, durante brincadeiras, desenhos. Por isso, o que a gente sempre alerta, sobretudo aos familiares, é a atenção a essas mudanças”, explica a psicopedagoga e professora da FPB Janaína Correia. Para amenizar o sofrimento psíquico são necessários anos de terapia para a vítima e familiares, que também necessitam de auxílio para lidar com a situação e ajudar a criança. Conforme relatado pelas de- legadas entrevistadas, conselheiros tutelares e vítimas, na maioria dos casos os aponta- dos pelos abusos são pessoas próximas da convivência da vítima, como pai, padrasto, vizinho ou conhecido da família.
No ano passado, o Disque 123, canal da Secretaria Estadual de Direitos Humanos (SEDH) recebeu 35 denúncias sobre casos relacionados à violência sexual em crianças e adolescentes na Paraíba, sendo 29 informes sobre abuso e seis sobre exploração sexual. Para a gerente de Proteção Social Especial da pasta, Gabrielle Andrade, esses dados seriam apenas uma estimativa desse problema, que afeta um número maior de vítimas. “A gente sabe que uma violência desse tipo é mais vela- da, camuflada. Então, quando recebemos essas denúncias isso indica apenas a ‘ponta do iceberg’, porque os números reais são bem maiores. O importante é que todas as denúncias recebidas pelo Disque 123 são apuradas e os casos encaminhados aos demais órgãos que formam a rede de prote- ção”, acrescentou a gerente. Gabrielle Andrade lembrou que as crianças e adolescentes vítimas de violência sexual são encaminhadas para atendimentos nos Centros de Referência em Assistência Social (Creas). O mesmo atendimento também é oferecido aos familiares das vítimas, com apoio psicológico, jurídico e médico. “Temos 26 Creas regionais que atendem a 120 municípios e outros 78 Creas municipais. Além das delegacias e conselhos tutelares, muitas vezes essas denúncias de abuso e estupro chegam diretamente aos Creas e temos equipes preparadas para acolher essas crianças e seus familiares, até porque muitas vezes essas pessoas são ameaçadas”, disse. Jornal da Paraíba